segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Entrevista com a escritora Elisa Alderani


A escritora Elisa Alderani  cultiva, com a força das palavras, "Flores do Meu Jardim", seu livro publicado em 2008.

Nesta matéria, o Blog não cumprirá as formalidades que precedem as entrevistas; ou seja, apresentar a entrevistada. Ela, a escritora italiana Elisa Alderani, é quem fará essa ritualística. 
Apenas acrescentamos um dado histórico para subsidiar o crédito  de uma frase que Elisa Alderani escreve no final deste nosso comentário.
"Na Nova Espanha, um intervalo, um parêntese histórico, o período de cativeiro da nação mexicana , viveu a freira e poetiza Sóror Juana Inés de la Cruz". - escreveu Octávio Paz, Prêmio Nobel da Literatura em 1990, na biografia  de Sóror Juana Inés.
Então, inspirada nela, Elisa envia esta mensagem aos leitores: "Ouçam-me com os olhos já que estão tão distantes os ouvidos; ouçam-me sem me ouvirem, pois escrevo muda".
Vamos lá, então; o Blog é seu, Elisa.



"Nasci em 22 de fevereiro de 1938, na cidade de Como, região da Lombarda, Itália. Em 1978, os caminhos da vida me levaram até Ribeirão Preto, estado de São Paulo, onde conheci muitos imigrantes italianos  e , por outro lado, recebi o carinho do povo riberopretano*. Não me naturalizei brasileira, não foi necessário.
Na Itália, em Como, minha cidade natal, concluí o curso técnico em química industrial. Ela era um polo internacionalmente conhecido na área da indústria têxtil. Após concluir o curso, trabalhei no laboratório de uma indústria química, analisava produtos para a confecção de tecidos.
No Brasil, depois de ter exercido a profissão de comerciária, aposentei-me e dei asas aos meus sonhos de escritora. Desde criança sempre gostei de escrever. Frequento,  desde 1997, as oficinas culturais na entidade SESC e participo de outras atividades na mesma. A partir desse ano, comecei a participar também de oficinas culturais da Casa da Cultura, a convite de uma amiga acadêmica. Trata-se de um grupo de estudo chamado “Flamboyant”, dirigido pela Professora Ely Vieitez Lisboa, Assim, comecei a exercer com mais segurança a minha inclinação para escrever.
Sou membro da Casa do Poeta desde o ano 2000, da União dos Escritores Independentes de R.P. (U.E.I.), União Brasileira de Trovadores (U.B.T.) e da UBE (União Brasileira de Escritores).
Tenho alguns trabalhos, prosas e poemas, publicados em trinta e cinco Antologias nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Ribeirão Preto. Alguns deles premiados.
Em 2008, publiquei meu primeiro livro bilíngüe: “FLORES DO MEU JARDIM - FIORI DEL MIO GIARDINO”, produção independente com finalidade solidária".




                                            ENTREVISTA

Nascida na Itália, veio para o Brasil onde reside. Fala fluentemente a Língua Portuguesa , escreve-a muito bem. Apesar disso, mergulhe fundo na memória e diga: em que idioma você raciocina? Italiano ou Português?
Responder a esta pergunta é um pouco difícil, depende do estado de espírito, há momentos que raciocínio em Italiano (lembrando alguns ditados de minha mãe e as orações aprendidas desde criança). Nas conversas com familiares às vezes falo italiano, mas logo em seguida volto ao Português, língua que exercito no dia a dia. Na escrita, alguns poemas talvez nasçam espontâneos em minha língua mãe, outras nascem no Português.

O que a impediu de realizar o sonho de ser freira?
Desde criança frequentei escola de freiras, participava muito de grupos de jovens de “AZIONE CATOLICA”; fui educada com bases sólidas no catolicismo, sentia-me atraída pela espiritualidade das freiras; depois da maturidade, a escolha foi de formar uma família, mas isso não me impede de continuar nos meus princípios religiosos. Desde que aposentei e os filhos casaram, sempre tenho um tempo para frequentar a comunidade e me realizo espiritualmente na Associação Legião de Maria e na Pastoral da Saúde da Paróquia, visitando doentes ou idosos.

O Papa é naturalmente o sucessor de São Pedro que era Santo. Assim, todo Papa a partir do momento que assume essa condição é Santo. Inclusive, é chamado de Santo Papa. Veja, por exemplo, que em Matheus 16:13-19, Cristo diz a Pedro: “Eu te darei as chaves dos Céus...”. Com isso, concede-lhe autoridade suprema; a partir daí, Pedro a transfere aos seus sucessores. Sendo assim, a canonização de João XXIII e João Paulo II não tem sentido. Ou tem?
Na condição de católicos praticantes, devemos aceitar a decisão dos Papas sobre a santificação de um ou outro Sumo Pontífice. A canonização DEPENDE DAS OBRAS EM VIDA e das apurações das Graças, recebidas pelos fiéis, depois da morte do  Papa que será santificado. Em minha opinião, o correto é seguirmos o Catecismo que foi elaborado por uma comissão de Cardeais e Teólogos escolhidos por Bento XVI. Caso o possua, dê uma conferida e constatará as minhas afirmações.
A expressão Santo Padre é uma maneira formal e respeitosa à pessoa do Papa. No mesmo Catecismo, constatamos as formas de tratamento ao Papa: Sumo Pontífice, Chefe da Igreja, Vigário de Cristo. Somente a Simão, a quem deu o nome de Pedro, o senhor o constituiu como pedra da Igreja.Entregou-lhe as suas chaves e o instituiu Pastor de todo o rebanho (N 880-881 do Catecismo da Igreja). 
Por fim, acredito que Pedro se tornou Santo pelo martírio ao qual foi submetido. Nenhuma vez Jesus o chamou de São Pedro. 

Giuseppe Garibaldi é considerado pela História como responsável pela unificação da Itália. Dê a sua opinião a respeito dele.
Na escola estudei a história dele (FAZ TEMPO), parecia-me uma lenda de tão bonita. Ficava fascinada pela coragem e força que ele tinha para lutar e recomeçar quando parecia ser dominado.
Considero Giuseppe Garibaldi um grande homem, ele nunca teve medo de lutar para defender e unir os povos do jugo dos opressores; veio, inclusive, ao Brasil. 
Aqui conheceu Anita, lutou com ela ao seu lado. Ela o acompanhou até a Itália e nas guerras ficou sempre junto com ele. Anita faleceu em Roma.
Giuseppe Garibaldi foi um homem de grandes ideais, conseguia com seu exemplo juntar fortes exércitos de soldados corajosos.
Lutou com todas as suas forças e estratégias militares e conseguiu unificar as regiões italianas que estavam sob o domínio estrangeiro.
Quase todas as cidades italianas têm uma praça dedicada ao nome dele. Amado pelos italianos é chamado “O HERÓI DOS DOIS MUNDOS”.
Graças a ele a Itália continua unida.


A exemplo do sobrenome Silva aqui no Brasil, quais os sobrenomes mais comuns na Itália: Pellegrini, Bellini, Amato, entre outros tantos?
A respeito dos sobrenomes, a resposta é complicada porque em cada  região da Itália prevalecem sobrenomes diferentes...
Na região onde eu morava, prevaleciam os “Bernasconi, os Noseda, os Tagliabue...Os Alderani atualmente são muitos; meu pai tinha mais irmãos e a gerações continuaram. Há outros sobrenomes que não me lembro; procurei uma agenda velha de minha mãe, mas não achei no momento; na região da Toscana,  a maioria dos sobrenomes acabam quase todos em “ucci”. Por exemplo: Carducci, Bertucci, Vespucci, etc. Os jovens - e isso de longa data - não ficam mais numa só região; na Itália, migram do sul para as regiões mais industrializadas; portanto, há uma mistura de sobrenomes.
A cidade de Ribeirão Preto tem muitos sobrenomes italianos, vieram como imigrantes para trabalhar na lavoura e/ou na cidade. O Conde Francisco Matarazzo - italiano da Calábria - trouxe muitos operários e técnicos especializados para trabalharem nas fábricas dele em São Paulo e Ribeirão Preto.  São poucos os que procuram saber de onde vieram os bisavôs ou os avós. Interessante, quando tinha loja, e descobriam que era italiana, me falavam o sobrenome do parente e pretendiam que eu conhecesse a região deles. Precisava explicar que a Itália é pequena, mas nem tanto para eu conhecer todo mundo.


A cidade de São Paulo, apelidada  de "Paulitália" pelos italianos, incorporou ao seu dia a dia muitos costumes da sua terra.
Na culinária, por exemplo, temos as cantinas do Bixiga (com i mesmo). Você sabia que o fundador do Grupo Schincariol, fabricante de cerveja localizado em Itu SP, foi fundado por um imigrante italiano, Primo Schincariol?
Em uma excursão cultural promovida pelo SESC para um "tour" pela cidade de São Paulo, tive a oportunidade de jantar no Bixiga. Além desse local, juntamente com o grupo, conhecemos também a Casa do Imigrante, lugar onde os recém chegados da Itália ficavam à espera para serem transferidos; além disso, visitamos Museus,  Catedrais, a Estação da Luz e o Mercadão.
O jeito de falar do paulista soa com  um sotaque   italiano contendo misturas de napolitano, calabrês, etc. São Paulo é uma cidade cosmopolita, mas as cantinas da culinária italiana continuam famosas.
Quanto ao senhor Primo Schincariol, não conheço a história de sua vida pessoal nem a empresarial. Mas sei que muitos  italianos talentosos vieram para o Brasil, fizeram sucesso e ficaram ricos. Como exemplo, temos o Conde Francesco Matarazzo (1854-1937) que construiu um império industrial aqui no Brasil.


A pizza é um prato tradicional da culinária italiana, por sinal muito apreciada pelos brasileiros. Qual o seu sentimento quando - aqui no Brasil - usam essa palavra para designarem soluções não satisfatórias para coisas erradas que acontecem; por exemplo, na política e outros segmentos.
Há tempo li, nas curiosidades de um calendário, o motivo pelo qual aqui no Brasil se fala desse jeito. Havia divergência de opinião sobre um assunto importante num grupo de estudantes e a reunião ia se delongar muito, de forma que todos ficaram com fome e resolveram ir comer alguma coisa para continuar mais tarde a discussão. No entanto, depois de terem comido bastante “Pizzas”, a discussão foi encerrada dessa forma. Acabou em Pizza!
Se for verdade, está aí o motivo desse “ditado” no Brasil!
Infelizmente, acho que não é só no Brasil que acontece isso, basta ler o jornal todos os dias. Em muitos países do mundo tem o jeitinho para acabar abafando os fatos.
Infelizmente, os problemas e divergências, sejam na política  ou na  sociedade, deveriam ser tratados com mais seriedade e só depois de resolvidos com justiça, serem festejados com uma deliciosa Pizza!


"Tudo o que sabemos é uma impressão nossa.
E tudo o que somos é uma impressão alheia".- escreveu Bernardo Soares-heterônimo de Fernando Pessoa. Dê a sua opinião a respeito da mensagem dessa frase.
O que sabemos é pouco, até sobre nós mesmos. Temos sempre alguma coisa oculta em nosso inconsciente.
O nosso jeito de ser, o nosso comportamento é julgado (nem sempre com bons olhos) pelas pessoas que estão à nossa volta. Isso não pode influenciar o nosso caráter; os alheios verão, sim, as nossas atitudes de falar e agir como somos de verdade, mas sempre teremos um porão escondido.

No seu caso há uma referência forte  em termos de transformação e renovação,   o período maduro do Renascimento.Esse movimento , nasceu na Itália.A partir dessa referência, quando Elisa Alderani passou pelos processos vitais de transformação e renovação que a vida nos impõe? Ou seja, quando desestabilizou as estruturas desordenadas que fazem parte da nossa vida? E onde começou a vivenciar esse momento? Na Itália, no Brasil ou nos dois países?
Acho que a transformação acontece aos poucos devido aos acontecimentos e circunstâncias que a vida nos impõe.Posso dizer que a transformação maior aconteceu aqui no Brasil.
Depois da tempestade vem a bonança, porque tudo passa. A sobrevivência é  difícil  pela dor da perda de alguém;  logo em seguida, veio a doença, mas q foi superada com a graça de Deus. Sinto-me agradecida a Ele pela concessão de um precioso tempo de silêncio e de reflexão.Esses acontecimentos foram necessários ao meu renascer com mais ânimo e projetos para o futuro. Mostraram-me que tinha condições de retomar com coragem a vida.Transformei a dor em poesia, e em mais comprometimento com meu próximo. Sinto-me feliz por esta escolha. Não sinto solidão, meu tempo é precioso.
Como fala Rubens Alves: ficaram poucas jabuticabas.


No seu livro “Flores do Meu Jardim”, qual o poema que Elisa fez e é uma poesia marcante para Lisute e vice-versa?
Por fim, quem escreve mais: Elisa ou Lisute?
Você me faz pensar quem das duas escreve... mas como responder...Vamos lá:
Posso dizer que quando é Lisute  escreve a cabeça volta à Itália com muitas lembranças; quando Elisa escreve,  está aqui no Brasil...
O poema marcante que Elisa escreveu, e é marcante para Lisute, chama-se   "ACONCHEGO DE MÃE"; só de pensar nela (mãe), escuto a sua voz me chamando carinhosamente.
Do lado oposto, Lisute escreveu o poema "ORAÇÕES", marcante para Elisa...
Este poema ganhou o Concurso da Academia de Letras de BH. Tenho a medalha e a Antologia, com também a crônica "REFLEXÃO INTIMA" que foi menção honrosa em 2006. Foi o incentivo para Elisa continuar a escrever. Fiz questão de colocar no livro Flores.
As duas se alternam na escrita brincando com as palavras.

Elisa ou Lisute escreveria um texto humorístico? 
Acho que não tenho competência para escrever textos humorísticos. Na TV italiana (quando morava lá), assisti  algumas comedias de Pirandello. I
Gosto de contar anedotas para as amigas ou algum fato ridículo ocorrido, mas escrever textos humorísticos , nunca pensei.


No seu livro "Flores do Meu Jardim", quais tipos de flores representam os seus familiares?
Logicamente são os familiares; eles são “as flores mais perfumadas”,  sempre me apoiam e ajudam com imenso carinho!

Fora do Mar Territorial e/ou além dos limites do espaço aéreo da Itália, Brasil ou de outro país, vocês já escreveram (incluo a Lisute) algum poema? Um poema, portanto, sem nacionalidade.
Quando estou viajando sempre tenho um caderninho de notas e uma caneta nas mãos. Não me lembro de ter escrito poemas, mas gosto de escrever crônicas, descrever o lugar ou o que mais me chama atenção; na última excursão (do ano 2010), visitei Portugal, Espanha, França e, por último, a Itália. Tenho muitas anotações: na Espanha, me encantei com a cidade de Toledo, de Ávila e a mística cidade de São Thiago  de Compostela.
Posso colocar um pequeno trecho de minha descrição poética, se interessar.
Claro que pode, Elisa.
A caminho de Fátima.
A paisagem é montanhosa com bastantes árvores e de vez em quando aparece um grupinho de casinhas coloridas; a estrada é boa e o clima fresco. O ônibus passou em uma zona industrial com algumas chaminés fumegantes. De longe, aparece um castelo, mas ainda não sei se é o Forte da Batalha que  o guia nos falou. Correm pequenos campos de vinhedos, cultivados em linhas oblíquas nas colinas verdejantes. À beira do caminho muitas pedras cobertas com redes metálicas para ser contidas.
Chegamos à Fátima e o espírito transborda de emoção ao encontro da grandiosidade cálida dos lindos templos, ao encontro da Virgem Maria!...

E sobre um possível próximo livro, o que dá para contar?
Ainda não resolvi nada, comecei só separar alguns poemas mais recentes, mas sinto-me insegura. Ainda tenho muitas dúvidas para resolver se o faço bilíngue ou só no idioma português.

Há algum assunto que você gostaria de abordar e que não consta nas perguntas desta entrevista? Caso haja, fique à vontade para comentá-lo.
Quero dizer que esta Lisute escreve há muito tempo, desde a juventude; no entnato, tudo ficava na gaveta ou numa agenda. Devido às muitas mudanças, perdi os textos em italiano.
A retomada da escrita decisiva e assumida aconteceu com a Elisa atual que tomou coragem para elaborar os seus textos; tudo aconteceu naturalmente, desde o ano 2000, quando comecei frequentar a Casa do  Poeta e Escritor, de Ribeirão Preto.


*Gramáticos conceituados, entre eles Napoleão Mendes de Almeida, recomendam que se    escreva "riberopretano" , adjetivo pátrio (gentílico)  de quem nasce  em Ribeirão Preto.






Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...