Professor Abílio, sua esposa, Eulália e a filha caçula, Beatriz |
O início de suas aulas se dividia em dois momentos matematicamente calculados. No primeiro, chegava rápido, sempre vestido com o seu inseparável jaleco branco. De imediato, preenchia com exercícios as duas lousas da sala de aula. No segundo, com um jeito matreiro, fazia a chamada. A essa altura, os alunos já estavam resolvendo os exercícios. Como se vê, não perdia tempo.
Zoca nos dias atuais |
Jornalista Quim Moreira |
E do quarto exercício em diante, o que acontecia? A coisa pegava. Se, por um lado, havia alunos que interagiam com a matéria, havia, por outro, os que eram fracos em Matemática. Diante desses, seu Abílio usava a psicologia. Olhava pra um, pra outro, e dizia: "Quem vem? Quem vem? Quem vem?" Não estava chamando ninguém pelo nome, mas era como se chamasse. De repente, alguém se levantava e caminhava de cabeça baixa até o quadro negro.
Nesse momento, caso o aluno não desenvolvesse o exercício, o professor dizia: "Preste atenção, que é simples." E o ensinava prazerosamente, era generoso ao ensinar. Pôr os pingos nos "is" das dúvidas, isso era com ele. Com esse método, motivava esse tipo de aluno a progredir na Matemática.
Jornalista Chico Senna |
Professor Abílio provocando risadas |
Outras vezes, dirigia-se para a turma do fundo da classe. No meio
dela, o Jamil Sahium. Por sinal, um grande colega. Encarando aquela turma, o
professor Abílio dizia três vezes: "Sai um lá de trás e vem.",
"Sai um lá de trás e vem.", "Sai um lá de trás e vem.".
Fingia que chamava qualquer um, mas, na realidade, estava chamando o Turco,
apelido carinhoso pelo qual o Jamil Sahium era tratado. E lá ia ele para a
lousa. A classe desabava de tanto rir.
Era comum os colegas brincarem com o Jamil antes das aulas de
Matemática: "Jamil, hoje você não escapa do Abilião." Alguns alunos,
de vez em quando, costumavam acrescentar o sufixo gradual "ão" e
dizer Abilião (ao invés de Abílio). Não em sentido pejorativo, mas carinhoso.
No entanto, frente a frente, jamais alguém o chamou dessa maneira. À distância,
nas conversas, o pessoal chamava, mas baixinho. Era o respeito que ele, com carinho e competência, conquistava junto aos alunos.
Vivíamos a década de sessenta. Nela, hoje é possível
compreendermos, ele e os alunos traziam nos ombros o peso da Matemática
Moderna. Implantada naquela época, alterou de maneira estrutural o ensino da
Matemática. Com ela, em substituição ao tradicional método do raciocínio,
chegou um mundo de simbolismos, sentenças matemáticas, teorias dos conjuntos
etc.
Oswaldo Sangiorgi |
O novo método vigente na prática escolar do Brasil aterrorizava alunos e
professores. Para muitos, havia nele um certo empobrecimento dessa disciplina.
Quem teorizava esse aspecto não eram os leigos, mas os especialistas no
assunto. Essa questão dividia opiniões.
Quase cinco décadas se passaram. Não é necessário dizer, ou pelo menos
não deveria ser, que o professor Abílio, quando o assunto versa sobre
Matemática, é imprescindível.
Hoje, diante de qualquer livro dessa matéria, os alunos daquela época não folheiam duas páginas sem que surja a lembrança desse fenômeno chamado Abílio França Valente, um português na Matemática.
Autor: Augusto Aguiar
Agradeço aos netos dos professores Abílio França Valente e Eulália do Prado Valente, Ricardo e Roberto, pela valiosa colaboração no que diz respeito à cessão das fotos que ilustram esta matéria.
Nossos professores , sejam do primário ou ginásio ou até de faculdade, sem dúvidas,foram pessoas inesquecíveis. A rigidez da minha professora de Matemática , dona Maria,seguia a exemplo de Sr. Abílio, esse método interativo de educar e construir futuros cidadãos... ;)
ResponderExcluirFui aluno da professora Eulália na primeira série do IEPC em 1967 no período da tarde. Contudo,para mim, o melhor professor que tive durante toda a minha passagem até o terceiro colegial em 1973,foi o professor Abílio na segunda série do ginásio em 1968 no período da tarde. Ele colocava três exercícios na lousa para serem resolvidos. Quase sempre eu acertava um deles e ia fazer na lousa. Ele dizia que determinado exercício era do Seu Almeida. Um tempo maravilhoso. Engo Waldomiro Almeida Junior.
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